terça-feira, 19 de março de 2013

Seminário da Cooperação Descentralizada - Mosaico Sertão Veredas - Peruaçu/MG e Parque Natural Regional Scarpe - Escaut / França

Mosaico Sertão Veredas - Peruaçu em debate: memória do Seminário 



Aconteceu entre os dias 04 e 08 de março, em Januária, o I Seminário de Cooperação Técnica entre o Mosaico Sertão Veredas - Peruaçu e o Parque Natural Natural Regional Scarpe - Escaut / França. O seminário é fruto da Cooperação Descentralizada, ou seja, entre as regiões do Brasil e da França assinada entre os governos de Minas Gerais - com a coordenação do  IEF e  Mosaico Sertão Veredas - Peruaçu  - e  da  Região de Nord- Pas-de-Calais (NPDC)  - com a participação do  Parque  Natural Regional Scarpe - Scaut.

Essa articulação entre regiões é fruto da Cooperação Bilateral entre os governos da França e do Brasil ocorrida entre os anos de 2005 e 2010. . Teve por objetivo a troca experiência entre os Parques Naturais da França e os Mosaicos de Áreas Protegidas de todo o Brasil, reconhecidos através dos projetos realizados no edital 01/2005 do Fundo Nacional de Meio Ambiente (FNMA)/Ministério do Meio Ambiente (MMA). Neste sentido, o  Mosaico Sertão Veredas - Peruaçu foi representado pela ONG Funatura de um dos projetos na época. Seguiu como mote os temas ligados à  Gestão Integrada de Áreas Protegidas, Identidade e Gestão Territorial. Com o fim desta Cooperação os trabalhos de divulgação e articulação em rede vêm  sido conduzido  pela Rede de Mosaico de Áreas Protegidas, fruto deste trabalho. Ver site http://www.redemosaicos.com.br/

O seminário: experiências e trocas

O seminário contou com a participação de 
25 participantes de Minas Gerais representando instituições e movimentos sociais que atuam no território delimitado pela política ambiental de Mosaico de Áreas Protegidas. Sua abrangência é composta por 10 municípios do Norte e Noroeste de Minas Gerais e 1 do Oeste baiano, totalizando 14 Áreas Protegidas. Ver link: http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/mosaicos/mapa-grande-sertao.jpg. E, 06 integrantes da delegação francesa, representada por 04 técnicos do Parque Natural,  um professor do Departamento de Geociências e uma doutoranda da Universidade de Lille.

Ao longo de 4 dias intensos foram trazidos ao debate as experiência de ambas as regiões. Com o objetivo de ter um nivelamento das informações, o primeiro dia de seminário, trouxe na programação as apresentações institucionais do SESEMA/IEF, Funatura, NPDC Parc Scarpe - Scaut. Na parte da tarde aconteceram as apresentações dos projetos em implementação no Mosaico, sendo estes: do Instituto Rosa e Sertão  "Turismo de Base Comunitária do Mosaico Sertão Veredas - Peruaçu" apresentado pela coordenadora do projeto Danielle Alves, e o da Cooperativa  Sertão Veredas "Extrativismo Sustentável no Mosaico Sertão Veredas - Peruaçu" pelo seu coordenador Marco Túlio. Ambos os projetos financiados pela Caixa Econômica/Fundo Socioamabiental. 

No segundo dia de seminário foi realizada visita de campo ao Refúgio de Vida Silvestre do rio Pandeiros. 


Visita ao Refúgio de Vida Silvestre do Pandeiros

Grupo de Trabalho

Na parte da tarde, ocorreu a visita a Comunidade de Traçadal, município de Januária. Em especial, foi apresentado o trabalho da Cooperativa Agroextrativista de Pandeiro pelo presidente Senhor Bauzinho e brindados com a participar do Grupo de Folias de Reis da comunidade

Grupo de Folia da Comunidade Traçadal

No terceiro dia assistiu-se a apresentação das experiências voltadas a Gestão das Águas com  a participação do IGAM de Montes Claros, e no período da tarde o tema Diagnóstico Territorial foi central. Ainda, ao final do quarto dia adentrou-se a experiência da França na gestão dos Parques e o sistema de georreferenciamento realizado pelo Parque. Por parte de Minas Gerais foi apresentado a metodologia do Zoneamento Econômico Ecológico (ZEE) pelo IEF Regional de Januária e do monitoramento de áreas de relevância biológica. No tocante da Agricultura a Cooperativa Sertão Veredas apresentou o trabalho com os extrativistas e as preocupações acerca do que vem acontecendo com as áreas de Cerrado e da importância de medidas urgentes pelo Estado e da Sociedade Civil Organizada com relação ao uso de agrotóxicos na região. Ainda, contou com a participação da WWF trazendo os trabalhos que vem desenvolvendo no bioma Cerrado e no Mosaico Sertão Veredas - Peruaçu em parceria com as instituições locais.

Ao decorrer foi apresentado pelas instituições do Mosaico metodologias que envolvem a participação dos atores locais e, com isso,  a importância de entendermos que o Cerrado tem seu valor biológico, mas também Cultural, sendo necessário maior aproximação dos agentes ambientais junto aos atores locais. Neste sentido,  a exposição do Plano de Desenvolvimento de Base Conservacionista, pela Funatura, demostrou como se deu o processo de participação e construção deste Plano.  Ver link: http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/mosaicos/plano-dtbc.pdf

A apresentação dos participantes franceses teve como mote a construção da Carta Parque (Instrumento de Gestão e Implementação dos Parques Naturais), os instrumentos de Gestão Territorial (Mapeamentos e diagnósticos utilizados) e a como se dá a participação social na condução do Parque Natural. Também, contou com a apresentação do estudo de doutorado que será realizado a partir desta cooperação por Lucy, aluna da Universidade de Lille. Um detalhe interessante trazido ao longo deste encontro é a metodologia que é utilizada para se criar um Parque Natural na França. Os parques franceses foram os inspiradores para a categoria Área de Proteção Ambiental (APA) no Brasil. Assim, os Parques Naturais é composto por "paisagens naturais" e também "paisagens produtivas", ou seja, não há como pensar uma área intocada, relembrando a "natureza selvagem". A mediação realizada pela equipe técnica do Parque envolve contato direto com processo de produção aliado com a "sustentabilidade"  tendo como princípio a relação "sociedade e natureza". O tempo estimado para a criação e da construção da Carta Parque gira entorno de 12 anos, sendo este renovado a cada 10 anos. Este processo é longo, pois demanda uma participação de todas as esferas (produtores, instituições, municipalidades) e de muitos estudos densos no campo da Ecologia Política, Ecossistêmica e da Geografia. Após este processo é firmado e assinado um termo entre todos os atores envolvidos. Os recursos para equipe técnica, pesquisa, gestão e monitoramento é garantido pelas instituições locais e as municipalidades. Todos os trabalhos apresentados contou com o uso de mapas e pontos georreferenciados chegando a ter mapas com o uso de escala de 1/7.500. 

A partir do tema "território" foi apresentado pelo professor Cássio da Silva (Unimontes) o seu trabalho de tese desenvolvido na Terra Indígena Xackiabá. Esta exposição adentrou a noção de "conflito ambiental" relacionado ao acesso e uso do rio São Francisco e de "território". Atentou para o fato da noção de território partindo do olhar do Estado ( um olhar de Fora) e dos povos (um olhar de dentro). Em seguida, foi apresentado pelo Instituto Rosa e Sertão o "Projeto Nova Cartografia Social"  coordenado pelo professor Alfredo Wagner da Universidade Federal da Amazônia. A coordenadora executiva discutiu a relevância deste trabalho e da apropriação do processo  da realização das cartografias e da própria cartografia em si como instrumento de luta e reconhecimento dos territórios "tradicionalmente ocupados" pelos povos e comunidades tradicionais. Ver link: http://www.novacartografiasocial.com/

Chamou a atenção para os trabalhos que vem sendo desenvolvido no Mosaico trazendo o uso de "cartografias ambientalizadas"*. Sendo  estes instrumentos de poder com base conservacionista e sem apropriação daqueles que mantém o Cerrado em conjunto com as Áreas Protegidas do Mosaico Sertão Veredas-Peruaçu. Sendo o mapa um instrumento de poder, classificação e escolha é necessário uma  discussão mais aprofundada com relação às metodologias escolhidas e de que estamos falando, provocou o professor da Universidade de Lille. 

Para uma discussão acerca da presença de "territórios tradicionalmente ocupado" como  Quilombos e Terras Indígenas neste contexto,  é necessário atentar para o fato que a política ambiental de Mosaicos de Unidades de Conservação - se tratando da leitura do SNUC - estes territórios não são reconhecidos oficialmente como áreas protegidas do Mosaico**. Sendo estes construídos com bases no pertencimento do lugar, afetivo, de luta e reconhecimento identitário. Ao se reconhecer um Mosaico de Áreas Protegidas é importante que se entenda que não há como separar ou recortar paisagens "naturais". Assim, é necessário   perceber que qual seja o território em questão - da política pública ou do vivido - , este está carregado de significados, com diferentes formas de uso, acesso e de pertencimento. Neste sentido, o  papel dos atores e agentes sociais envolvidos nesta política  é fundamental para que este reconhecimento seja firmado e ecoado de suas bases***. 

Por fim, ficou deliberado pelo grupo participante 5 temas de relevância para discussão ao longo da Cooperação, sendo eles: i) Governança e Participação Social; ii) Identidade e Paisagem Cultural; iii) Desenvolvimento territorial e certificação; iv) Uso e Acesso aos Recursos Naturais e, iv) Ferramentas de diagnóstico "Trama Ecológica" e "Zonas úmidas".

O próximo Seminário acontecerá em setembro de 2013 na região de Nord- Pas-de-Calais. Contará com aproximadamente 6 representantes brasileiros que contribuirão para a condução das propostas firmadas nesta cooperação. 

Cabe as entidades envolvidas no território do Mosaico Sertão Veredas - Peruaçu difundir o debate. 
O Instituto Rosa e Sertão vem acompanhando às discussões e contribuindo para que além das Unidades de Conservação e das Políticas Ambientais, sejam discutidos temas voltados aos direitos territoriais dos povos e comunidades tradicionais e do uso e acesso aos recursos naturais. 

O que fica neste primeiro encontro é que a troca de experiência é sempre bem vinda. E, que cada ator social participa e constrói com o que tem a aprender e ensinar. É importante atentarmos para as comparações que possam vir a surgir, lembrando sempre que ao longo de várias décadas o uso das "cópias" trazidas da Europa foram  atualizadas e nem sempre questionadas. Saindo da impessoalização do processo que nos leva a falar de instituições e governos conduzindo as ações, pontuamos que são técnicos ambientais, representantes de movimentos socioambientais e ambientalistas que estão diretamente ligados a este processo. Cabe ao grupo internalizar a importância do estabelecimento da simetria  e, ainda, que tanto na Europa quanto na América Latina encontramos várias experiências de excelência pensando a relação sociedade/natureza.

Acreditamos que o acesso a informação e a participação social são instrumentos importantes neste movimento.

Divulguem e participem!

*Ver ACSELRAD, Henri
***Nota da autora

Fotos: Evandro Rodney
Texto: Damiana Campos


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